quarta-feira, 21 de junho de 2017

Bioquímica do Eritrócito - Metabolismo energético das Hemácias

Os eritrócitos (ou hemácias) são resultado de um processo complexo de diferenciação celular a partir de células-tronco hematopoiéticas, também chamadas de hemocitoblastos.



A produção de eritrócitos (processo denominado eritropoiese) é estimulada pela Eritropoetina, glicoproteína sintetizada principalmente nos rins mas também na medula óssea, onde ocorre a eritropoiese.

O aumento da produção da Eritropoetina é determinado principalmente pela diminuição da oxigenação tecidual (hipóxia), que pode ser causada por fatores como diminuição do volume sanguíneo, anemia, diminuição da concentração de hemoglobina, redução do fluxo sanguíneo e doenças pulmonares.



O processo de diferenciação ocorre em duas etapas:

Na etapa inicial, há uma fase de proliferação celular, com grande síntese de ácidos nucleicos, pois para que as células se dividam, o conteúdo genético precisa ser dobrado. Nesse momento, é essencial a presença da vitamina B12 e do ácido fólico. A carência de vitamina B12 no organismo pode levar a uma doença chamada anemia perniciosa, em que há diminuição da síntese das hemácias.

A eritropoiese continua através de eventos de maturação celular até a formação dos eritrócitos, onde o evento mais importante é a síntese de hemoglobina. Ao atingir determinada concentração de hemoglobina, a célula é liberada para a corrente sanguínea, geralmente ainda na forma de reticulócito, e posteriormente perde o retículo endoplasmático, completando sua maturação e dando origem ao eritrócito.

Os eritrócitos são células maduras desprovidas de núcleo, mitocôndria, retículo endoplasmático e organelas em geral, pois durante o evento de maturação, as organelas são perdidas. Essas células, portanto, são compostas por uma membrana plasmática semipermeável e contém alta concentração de hemoglobina em seu citoplasma (aproximadamente 95%).



A hemácia madura possui uma vida média de 120 dias no ser humano, tempo que varia entre as espécies. Essa célula possui formato característico de disco bicôncavo, essencial para aumentar sua superfície de contato e, consequentemente, aumentar sua capacidade de transporte de gases (O2 e CO2), que é a principal função das hemácias. O CO2 não é transportado diretamente pela hemácia mas, apesar disso, ele precisa passar pela hemácia para ser transformado em bicarbonato e então ser transportado pelo plasma.

A simplicidade estrutural da hemácia é acompanhada por consequências metabólicas e funcionais, pois sem as estruturas normalmente comuns às outras células (como núcleo, mitocôndria, ribossomos, retículos e outras organelas), o eritrócito não consegue nem duplicar nem ressintetizar enzimas ou proteínas estruturais que envelhecem com o tempo. A célula acaba sendo incapaz de utilizar o mecanismo de fosforilação oxidativa, pois não possui mitocôndria, e sua capacidade de produzir ATP é mínima, contando apenas com as enzimas citosólicas da via glicolítica presentes nessa célula.

A hemoglobina, principal proteína presente no citoplasma no eritrócito, é composta por uma porção globínica (a parte proteica propriamente dita) e uma parte do grupamento heme, que possui o Ferro central em sua estrutura e que confere cor vermelha ao sangue. A hemoglobina é um tetrâmero composto por duas subunidades alfa (α) e duas beta (β). Cada uma dessas subunidades pode se ligar a um O2.



As necessidades energéticas da hemácia são pequenas, pois o transporte de gases é um evento passivo, que não precisa de energia. Entretanto, essa célula precisa de energia para três categorias de processos fisiológicos:

1. Manutenção da integridade estrutural e funcional da membrana celular
Manutenção da forma da célula, capacidade de se deformar reversivelmente (para passar por capilares pequenos, por exemplo), manutenção da bomba de cátions (Na+/K+ ATPase) para manter a força iônica dentro da célula, proteção de suas proteínas contra fosforilação oxidativa.

2. Manutenção do ferro hemoglobínico no estado ferroso (Fe²+)
Quando o ferro hemoglobínico é oxidado (Fe³+), há conversão da hemoglobina em metaemoglobina, que não possui capacidade de transportar o oxigênio.

3. Manutenção das vias metabólicas de produção de energia utilizável
Como a hemácia não possui mitocôndria, suas vias metabólicas ocorrem no citoplasma. Portanto, para esse tipo celular, a única fonte de energia é a glicose, pois a hemácia é incapaz de oxidar ácidos graxos e aminoácidos. Cerca de 90% da glicose que o eritócito capta é metabolicamente oxidado na via glicolítica e tem como produto final o lactato, ou seja, é uma glicólise anaeróbica. Na glicólise, o piruvato produzido é fermentado a lactato, permitindo que a via glicolítica continue, pois quando o piruvato vai à lactato, o NADH produzido na via glicolítica volta a ser NAD (é reoxidado).



Além da via glicolítica, há a ocorrência da via das pentoses na hemácia, que possui um fluxo metabólico bem menor (aproximadamente 10% da glicose que entra na célula vai para essa via). e nessa via cada molécula de glicose gera duas moléculas de NADPH.

Como no eritrócito tanto a fase oxidativa quanto a fase não oxidativa da via das pentoses estão ativas, ela acaba sendo cíclica, pois quando a ribulose-5-fosfato é formada, as enzimas da fase não oxidativa retornam essa molécula para glicose-6-fosfato. O NADPH gerado na via das pentoses é essencial para a produção de grupos tiol da hemoglobina, e também para proteínas de membrana contra oxidação. Ele exerce essa função protetora de forma indireta, mantendo os níveis celulares de glutatião reduzidos.



Portanto, a via glicolítica e a via das pentoses são as vias geradoras de moléculas energéticas (ATP, NADH e NADPH) nas hemácias.

Uma importante via de gasto energético é a Via de Rapport-Luebering, uma via de desvio da via glicolítica que gera o 2,3-difosfoglicerado. Essa via faz com que não haja a síntese de 1 ATP da via glicolítica. Apesar disso, ela é de extrema importância, pois o 2,3-DPG consegue se integrar com a molécula de hemoglobina diminuindo sua afinidade com o O2 e permitindo a oxigenação dos tecidos.


Outra via de consumo é a Via de Síntese de Glutatião (ou Via Glutationa), e a manutenção desse tri-peptídeo no estado reduzido. Nessa via, são gastas duas moléculas de ATP para que ocorra a ligação peptídica entre os aminoácidos (Glutamato, Cisteína e Glicina), formando o glutatião. 


Quando essa molécula de glutatião reduzida reduz outra proteína, ele fica organizado formando pontes de enxofre com outra molécula de glutatião, gerando a forma oxidada do glutatião. Para a fisiologia celular, o interessante é que o glutatião fique em sua forma reduzida, pois assim ele pode reduzir outras proteínas.



O NADPH da via das pentoses serve como poder redutor para que o glutatião passe de seu estado oxidado para seu estado reduzido (a enzima glutationa redutase usa o poder redutor do NADPH para essa reação), e a enzima glutationa peroxidase usa o poder redutor do glutatião para reduzir o peróxido de hidrogênio (H2O2) à água (H2O), impedindo uma série de danos oxidativos que podem acontecer a lipídeos e proteínas dessa célula, amenizando esses sintomas de envelhecimento da célula.



A última via é a Via da Metaemoglobina Redutase, que se utiliza do poder redutor do NADH e do NADPH para transformar a metaemoglobina em hemoglobina, o que é de extrema importância, já que a metaemoglobina é incapaz de transportar oxigênio. 

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